quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Tirem as mãos dos direitos da classe trabalhadora!


Ao contrário dos argumentos que a mídia vem levantando, a crise econômica atual não pode ser encarada como algo normal, ou mesmo, como um peso necessário com que os trabalhadores e pobres devem arcar juntamente com seus patrões. Essa crise, na realidade, está intrinsecamente ligada às medidas tomadas pela burguesia nas últimas duas décadas para sair da crise econômica de grande proporção que houve na década de 70. Essas medidas, que ficaram conhecidas como agenda neoliberal, foram necessárias justamente por que o programa Keynesiano de intervenção estatal na economia, que hoje volta a ser tão reivindicado pelas “viúvas de Keynes”, se mostrou insuficiente para fazer com que as taxas de lucro da burguesia voltassem a crescer. Todavia, essas medidas neoliberais ainda que num primeiro momento lograram sucesso, acabaram por acelerar os elementos de crise estrutural do capitalismo.


O entendimento dessa lógica é parte crucial para que nós compreendamos a necessidade de nos organizarmos para garantir que não sejam os trabalhadores, pobres e a juventude quem pague os prejuízos dessa crise causada pela ganância dos empresários. Por tanto, nossa luta deve partir da seguinte palavra de ordem: Não pagaremos pela sua crise!
E essas palavras se fazem de extrema importância haja vista as medidas que as entidades patronais vêm anunciando como solução para escapar da crise, em outras palavras, medidas que permitirão transferir “com eficiência” as perdas econômicas para os bolsos dos trabalhadores e pobres brasileiros. Cabe aqui então, iniciarmos uma reflexão a cerca de uma parte importante desses ataques patronais. São as chamadas reformas neoliberais. Vejamos as mais importantes.


A primeira delas é a chamada reforma trabalhista. Nos últimos dias a discussão sobre a aprovação dessa reforma voltou à tona nos noticiários e editoriais dos jornais. Todos partiam do cínico argumento de que nossa legislação trabalhista, principalmente a CLT, é demasiadamente “arcaica” e protecionista. Sendo assim, acabam por impedir que o Brasil seja mais competitivo, continue crescendo economicamente e escape dos efeitos da crise mundial. Ou seja, para os patrões e empresários brasileiros a solução para escapar da crise e garantir o crescimento econômico (leia-se mais lucros ao patronato) seria justamente cortar os mais elementares direitos e garantias que os trabalhadores conseguiram ao longo de décadas de muitas lutas. Entre muitas propostas que essa reforma traz, algumas são ataques mais velados, como o fim da negociação coletiva (enfraquecendo dessa forma as entidades da classe trabalhadora e propiciando mais flexibilização dos direitos através da pressão individual do contrato de trabalho), mas também existem ataques mais claros como a proposta do fim do 13° salário (enquanto os deputados federais ganham até 15° salário) e da licença maternidade, entre outros. No entanto, as entidades patronais e o governo sabem que tais medidas provocariam uma resposta por parte dos trabalhadores, e então adotaram a sistemática de aprovar tais reformas de maneira fragmentada. É o caso da Lei complementar 123/06 que instituiu o SUPERSIMPLES, um plano que permite, entre outras coisas, que as micro e pequenas empresas flexibilizem alguns direitos trabalhistas. Uma rápida leitura do seu artigo 51 deixa claro tal fato:
Seção II
Das Obrigações Trabalhistas
Art. 51. As microempresas e as empresas de pequeno porte são dispensadas:
I – da afixação de Quadro de Trabalho em suas dependências;
II – da anotação das férias dos empregados nos respectivos livros ou fichas de registro;
III – de empregar e matricular seus aprendizes nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem;
IV – da posse do livro intitulado “Inspeção do Trabalho”; e
V – de comunicar ao Ministério do Trabalho e Emprego a concessão de férias coletivas.

Vale lembrar que 60% da classe trabalhadora brasileira hoje está em empresas classificadas como micro e pequena. A reforma trabalhista e o Super Simples vão a sentido oposto aos direitos sociais e de proteção ao trabalhador que garante a Constituição Federal de 1988 no seu artigo 7°. Vejamos:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;
III - fundo de garantia do tempo de serviço;
IV - salário mínimo , fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;
V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;
VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;
VII - garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável;
VIII - décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria;
IX – remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;
X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;
XI – participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei;
XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei; Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98:

Mais uma vez fica claro que os patrões e empresários estão dispostos a “passar por cima” das mínimas garantias constitucionais quando se trata de manter seus altos lucros.
Nesse mesmo caminho está a reforma tributária cujo projeto já está tramitando no Congresso nacional. Trata-se na verdade de uma série de orientações diretas do FMI, BID e entidades patronais nacionais que visam desonerar a carga tributária das empresas, através da extinção de uma série de tributos que os patrões arcam hoje, e em contrapartida, aumentar a arrecadação através de tributos ligados ao consumo de primeira ordem, ou seja, atingindo exatamente o bolso dos mais pobres.


Ainda que não iremos encerrar o rol de reformas neoliberais, não poderíamos deixar de citar, ainda que sucintamente, mais duas delas: A reforma da previdência e a reforma sindical.
No caso da primeira é importante dizer que já teve uma de suas partes aprovada pelo Congresso e sancionada pelo governo Lula em 2004. Ainda que tal reforma apresente uma série de medidas complexas que não conseguiríamos encerrar o debate nesse breve texto, podemos concordar que em última instância traz consigo uma maior dificuldade para que os trabalhadores alcancem suas aposentadorias (aumentando o tempo de contribuição) e que consigam a liberação de auxílios e pensões. È a tentativa mais ousada de “preparar o terreno” para a privatização de todo o sistema previdenciário brasileiro.


Finalizando a lista das reformas neoliberais que queremos pincelar nesse trabalho, encontra-se aquela que para nós é a base para a aplicação de todas as demais: A reforma sindical. E sustentamos isso, pois seu conteúdo tem por base o enfraquecimento e o maior atrelamento ao Estado das entidades sindicais, justamente essas que deveriam organizar e preparar o conjunto dos trabalhadores para resistir à todos essas ataques. Essa reforma é um trabalho científico exercido pelo Governo e empresários para amarrar as organizações operárias ao aparato burocrático estatal minando-as de qualquer política de resistência.
Está mais do que claro que as reformas neoliberais e todas as medidas que de alguma forma retiram direitos sociais da classe trabalhadora são um claro atentado contra os Direitos Humanos. Por tanto, a defesa dos direitos elementares da classe trabalhadora é parte essencial da luta pelos Direitos Humanos.


Mais uma vez os estudantes de Direito são chamados a se posicionar


O atual cenário, que tentamos expor sucintamente acima, mostra como cada vez mais os estudantes de Direito, e também todos aqueles que defendem os direitos humanos, devem romper com o velho espírito de apatia que primava na década de 90 e se posicionar frente a discussões que dizem respeito aos problemas mais sensíveis da classe trabalhadora e do povo pobre. E essa nova postura deve começar dentro da Universidade, pois é justamente aí onde são pensadas e criadas as concepções e medidas que acabam por precarizar e aumentar o grau de exploração a que a classe trabalhadora é sujeitada. Acreditamos, todavia que é possível reverte esse quadro desde que tenhamos uma postura de disputar a universidade e os cursos de Direito para que estes estejam voltados a contribuir para avançar na ampliação dos direitos da classe trabalhadora e no combate a qualquer tipo de repressão que recaia sobre aqueles que lutam por melhores condições de vida.


Justamente por compartilharmos dessa concepção e da defesa dos direitos humanos desde um ponto de vista dos trabalhadores é que impulsionamos na UNESP de Franca o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos. Queremos ser uma alternativa para os estudantes de direito que querem colocar seu conhecimento à serviço dos explorados, começando por estudar, debater e responder aos problemas mais sensíveis que os atingem. Chamamos a todos os interessados a se somar ao nosso Núcleo.

Rafael Borges Barbosa Santos Direito Unesp- Franca
Membro do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

A TORTURA AINDA VIVE NOS QUARTEIS BRASILEIROS

No mesmo momento em que figuras do alto escalão do Exército brasileiro, cinicamente, pedem para que esqueçamos das torturas e dos horrendos crimes que estes mesmos cometeram durante a ditadura militar e que não deve ser feita nenhuma discussão a cerca da punição dos agentes torturadores, vem a público mais um exemplo de que o método de tortura não é algo do passado, mas sim uma política sistemática que os órgãos repressivos do Estado ainda levam a cabo. Um jovem de 16 anos, que pulou o muro de um terreno do exército no Rio de Janeiro, foi preso no mesmo local e torturado com choques, queimaduras e agressões físicas. Segundo o hospital que o atendeu, o rapaz sofreu queimaduras de 1° e 2° grau, possivelmente causada por um certo tipo de ácido, e corre o risco de ficar cego.
Os mesmos generais, coronéis e oficiais que torturavam militantes de esquerda e trabalhadores no passado mostram, dessa forma, que continuam na ativa, muitas vezes realizando chacinas nas favelas e reprimindo os movimentos sociais. A "missão" institucional do exército, prevista na Constituição Federal, mais uma vez ficou manchada de sangue com os reais objetivos do exército: A repressão e manutenção da ordem burguesa.

Até agora, o governo Lula e o PT, outrora defensores dos direitos humanos, não se manifestaram sobre o caso. E nem o farão, pois vêem esses militares torturadores como aliados políticos e assim como eles também estão comprometidos com manutenção da ordem dos ricos. Nós do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (UNESP FRANCA) chamamos todas as organizações de defesa dos direitos humanos, movimentos sociais e partidos de esquerda a repudiar de maneira veemente tal crime bárbaro. Exijamos a punição dos executores e também dos oficiais mandantes.

Para nós essa luta deve estar ligada com uma ampla campanha contra a "repressão de ontem e hoje". Ou seja, que exijamos uma investigação e punição a todos os crimes que o exército, a polícia e outros órgãos do estado cometeram durante o regime militar, assim como também dos crimes que essas mesmas instituições seguem cometendo contra a classe trabalhadora e o povo pobre.


Investigação e Punição de todos os militares, executores e mandantes, envolvidos nesse caso de tortura! Punição a todos os militares que torturaram no regime militar! Por uma ampla campanha em defesa dos direitos humanos da classe trabalhadora e do povo pobre!


NÚCLEO DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS - UNESP FRANCA

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

A Crise Econômica e o papel dos Direitos Humanos


O coração do capitalismo parou de bater?


Já não se trata de um simples susto, mas sim de um pânico geral. É assim que podemos resumir os efeitos da atual crise econômica. O que deveria ser, nas palavras dos analistas à serviço do capital, apenas uma queda normal das ações do setor imobiliário norte americano, já se alastrou para o mercado financeiro de toda a Europa, Ásia e América Latina, e já começa a afetar a economia real, com desemprego e queda na produção de alguns ramos.


Em apenas algumas semanas os dogmas neoliberais e de auto-regulamentação do mercado, que predominaram por toda a década de 90, começaram a ruir. Os que outrora discursavam a cerca do fim da História, do capitalismo como único regime possível e do fim da classe trabalhadora aparecem agora, de maneira tímida, tentando se justificarem. Outros preferem admitir seus equívocos e agora são ferrenhos defensores das doutrinas intervencionistas, principalmente do keynesianismo, como única forma de salvar o capitalismo.


Desse modo, nos últimos dias, governos de todo o mundo desesperadamente tentam tomar medidas e ações para aplacar os efeitos da crise. Talvez o exemplo mais emblemático seja o pacote de ajuda aos bancos que o governo norte-americano aprovou. Depois de uma crise política e racha dentro dos próprios partidos democrata e republicano, o presidente Bush conseguiu a liberação de 700 bilhões de dólares que serão utilizados para a compra de ações dos bancos que estão a beira da falência. É sempre importante lembrar que tal pacote de ajuda aos bancos se dá num marco onde o nível de desemprego bate recordes nos EUA, os trabalhadores perdem suas moradias e mais fábricas anunciam demissões. Ou seja, enquanto os trabalhadores norte americanos sofrem no dia-dia com a crise, o governo utiliza o dinheiro público para encher os bolsos dos banqueiros. E tudo isso feito sob a estrita observância do ordenamento jurídico, mostrando bem, dessa forma, a qual interesse a legalidade e as normas jurídicas servem.


E no Brasil, o que os trabalhadores e o povo pobre devem esperar?


As declarações do presidente Lula de que o Brasil está blindado da crise já se mostraram uma falácia. Puxada pela forte queda das bolsas norte americanas e européias, a Bolsa de São Paula (Bovespa) teve nos últimos dias os piores desempenhos de sua história. Foi, com toda certeza, uma pequena amostra de que não só o Brasil, mas todo o mundo, ainda é refém do maior mercado consumidor do mundo, os EUA.


Mas os efeitos da crise no Brasil não se restringem a queda na bolsa de valores, pois setores da economia real aqui também já demonstram suas debilidades. E a primeira região que foi afetada é a Zona Franca de Manaus, onde centenas de operários acabaram de ser demitidos. Além disso, várias montadoras de veículos da região do ABC já anunciaram férias coletivas, pois a produção anda baixa com a falta de crédito para a compra de veículos. Ainda não se sabe ao certo, mas ao que tudo indica, as filiais brasileiras deverão seguir o exemplo das espanholas e começar a demitir para cortar custos e se prepara para a crise.


O governo brasileiro, superando a fase do discurso da “blindagem”, também acaba de anunciar um pacote de ajuda aos bancos. Serão R$ 100 bilhões de reais destinados a aumentar a fluidez dos mercados financeiros e a ajudar bancos que estiverem com problemas. Tal verba, proveniente dos tributos pago pelos trabalhadores, é uma quantia bem a cima dos 13 bilhões que Lula reserva ao seu principal programa social, o Bolsa Família. Essa é a matemática do governo, migalhas à população pobre e somas estratosféricas aos banqueiros e especuladores.


A classe trabalhadora e povo pobre devem se preparar para tempos difíceis. O desemprego deve aumentar com as demissões em massa, o nível de exploração dentro das fábricas também, pois os patrões vão querer “acelerar as esteiras” para manterem seus lucros. No campo, cada vez mais incentivos ao Agronegócio em detrimento dos pequenos camponeses pobres. E com certeza cada vez mais os programas sociais e auxílios do Estado devem diminuir, pois o governo já mostrou que está bem disposto, se for preciso, a tirar o pouco dos pobres para garantir a fortuna dos ricos.


As reformas que visam retirar direitos (trabalhista, tributária e previdenciária) também só tendem a ser aceleradas. No campo do direito penal leis mais severas cujo objetivo é punir a juventude negra e pobre e esconder os reais motivos da violência e da criminalidade, também deverão ter suas aprovações aceleradas, garantindo, dessa forma, carta branca para que a polícia continue exercendo sua política de extermínio.


A educação e saúde pública, hoje já tão defasadas, cada vez mais ficarão secundarizadas, pois na visão do governo e dos empresários significam um mero gasto do dinheiro público e não um elementar direito do povo. Os capitalistas, para se salvarem da crise, estão dispostos a rasgar a Constituição brasileira e junto com ela os mínimos direitos da classe trabalhadora.


Defender os Direitos Humanos para que a crise não caia nas costas dos trabalhadores!




É nesse cenário que a luta pelos direitos humanos se mostra de extrema importância. Os direitos humanos, desde um ponto de vista da classe trabalhadora e do povo pobre, deve servir para auxiliar na luta contra a retirada dos direitos dos trabalhadores e contra a carestia de vida, que no contexto da crise econômica só tende a piorar.


Não podemos deixar que os empresários descarreguem nas costas dos trabalhadores e pobres os efeitos da crise causada por sua própria ganância. Não podemos aceitar que os capitalistas, passando por cima de todos os preceitos previstos nas normas que eles próprios redigem e aprovam, demitam em massa colocando milhares de trabalhadores nas ruas.


Sabemos, no entanto, que a classe trabalhadora não ficará passiva assistindo uma série de demissões, vendo seus salários se desvalorizarem e a polícia matar seus filhos. Mas ao se colocarem em luta os trabalhadores deverão se enfrentar com todo o tipo de repressão e violência por parte dos capitalistas, seja jurídica, política e principalmente física. È justamente nesse momento que os direitos humanos cumprem um papel fundamental contra a criminalização daqueles que lutam, fazem greves, ocupam terras e fábricas como única forma de sobreviver.


Defender os direitos humanos significa colocar todos os estudantes e profissionais que militam na área na perspectiva de solidariedade a todas as lutas da classe trabalhadora e do povo pobre, colocando nosso conhecimento técnico, teórico e prático para que não se recuem nos direitos e para que nenhum lutador do povo seja punido.

Os Direitos Humanos, os crimes da ditadura e o papel da esquerda.


“Por cada companheiro caído, não um minuto de silêncio, mas uma vida inteira de luta!”

Há alguns dias vem ganhando destaque na mídia a discussão a cerca da punição dos crimes cometidos pela ditadura militar. O debate ganhou fôlego depois das declarações feitas pelo ministro da justiça, Tarso Genro, e pelo secretário especial de direitos humanos, Paulo Vanucchi, que defenderam a responsabilização jurídica dos agentes violadores de direitos humanos durante o regime de exceção. No entanto, se apressaram em dizer que esse tema não deve ser prioridade para o executivo, o que já sinaliza a posição bem clara de Lula e dos demais membros do governo federal do PT de não tomar nenhuma medida para a punição dos bárbaros crimes cometidos contra estudantes, trabalhadores e militantes naquela época.

O regime militar brasileiro, iniciado em abril de 1964, se coloca no marco da ofensiva de determinados setores da burguesia brasileira, ligados diretamente com o imperialismo norte americano, contra as crescentes mobilizações da classe trabalhadora e do povo pobre em geral. Por mais de 20 anos o regime ditatorial perseguiu, torturou e matou milhares de pessoas. Em 1968 atingiu seu ápice totalitário com a decretação do ato institucional n° 5, que entre a eliminação de muitas garantias democráticas, fechou o Congresso e cassou uma série de políticos por serem considerados “progressistas”.

Durante todo esse período a classe operária, encabeçando o povo oprimido de conjunto, se colocou na luta contra esse regime. Primeiramente, se expressava na luta contra a política de arrocho salarial e por melhores condições de trabalho. As combativas greves de 68 em Osasco-SP e Contagem - MG são exemplos da radicalidade e disposição de luta dos trabalhadores nesse período. Era freqüente a palavra de ordem: “Abaixo a ditadura, o povo no poder”, que demonstra que os trabalhadores tinham a consciência de que era precisa colocar aquele regime abaixo e sob suas ruínas a construção de um poder operário e popular baseado nas combativas formas de auto-organização da classe trabalhadora que nasciam naquele momento. Mais tarde, já no final da década de 70, os combativos metalúrgicos de São Paulo e do ABC paulista protagonizarão massivas greves e manifestações, que assim como 68, começavam por demandas econômicas. Infelizmente, pelo papel que suas direções sindicais e políticas cumpriram, esses trabalhadores não puderam avançar até o patamar de um enfrentamento direto com o regime totalitário e na construção de uma verdadeira democracia dos trabalhadores. Vale destacar aqui o papel nefasto dos sindicalistas autênticos (que tinha em Lula sua maior figura) que não apoiavam a nascente auto-organização espontânea dos operários através das chamadas comissões de fábrica e lutaram até o final para eliminá-las, com o cínico argumento de que as comissões se contrapunham ao nascente sindicalismo. Esses sindicalistas, muitas vezes ovacionados por grande parte da esquerda, também impediam que a palavra de ordem “abaixo a ditadura” voltasse a se expressar, ao contrário, aumentavam as ilusões dos trabalhadores em uma constituinte democrática e cidadã dentro limites da legalidade burguesa.

Dessa forma foi se desenhando o que chamamos de “transição pactuada, lenta e gradual” para o regime político democrático burguês. A Lei n° 6.683 de 1979, conhecida como lei de anistia, foi expressão dessa transição pactuada. A grande maioria da esquerda naquele momento aceitou, ao invés de se apoiar nas lutas diretas da classe trabalhadora, em pactuar um acordo com os generais e a burguesia para colocar no mesmo patamar honestos militantes de esquerda que lutavam contra a ditadura com os militares assassinos e torturadores, anistiando-os todos. A lei de anistia encarna a própria política de traição das direções do movimento de massa e também a adaptação de grande parte da dita esquerda revolucionária a esta política.

O novo “velho” Regime que se iniciaria mais tarde teria a nova Constituição Federal (CF) de 1988 como pilar de sustentação, constituição essa que assim como todas as anteriores garante a propriedade privada e transforma os poucos direitos fundamentais no que chamamos de princípios programáticos, ou seja, direitos progressistas que estão na constituição, mas não tem nenhuma eficácia imediata, e que por tanto nenhum trabalhador pode os reivindicá-los no âmbito da justiça. Ao contrário da esquerda reformista, que insiste no discurso vulgar e leviano de que a CF 88 é um avanço e fruto do que era possível de se lutar naquele momento, achamos que ela expressa as traições das direções do movimento de massa e sua conseqüente subordinação aos mecanismos democráticos burgueses. É nesse marco que devemos compreender a luta pela punição aos crimes da ditadura. Trata-se de um direito democrático elementar da população brasileira que simplesmente foi “vendido” pela esquerda petista em troca de um lugar no novo regime político e algumas cadeiras no parlamento.

É preciso compreender a luta pelos direitos humanos desde um ponto de vista classista e tático, ou seja, os direitos humanos pelos quais lutamos vai muito além dos velhos preceitos escritos na revolução francesa e mais tarde repetidos pela carta de declaração dos direitos humanos das Nações Unidas, em 1948. Quando a luta pelos direitos humanos se reduz aos limites da legalidade e na atuação através de ações no judiciário fica desprovida de qualquer conteúdo e passa a ser mais uma válvula que alimenta as ilusões na justiça burguesa. Nesse caso vale um velho princípio do processo civil que diz que o Juiz não pode mover uma ação de ofício, ou seja, por conta própria, é preciso que haja manifestação da parte. Por tanto cabe as organizações, movimentos sociais e partidos de esquerda garantir essa manifestação. O caráter tático do direito nesse campo é importante para a fundamentação e a garantia dos trâmites processuais, todavia a certeza da punição dos torturadores só estará completa quando a classe trabalhadora e povo pobre, com seus próprios métodos de luta e organização, se colocar a frente de massivas mobilizações nas ruas, fábricas e universidades, de maneira independente de todos os setores burgueses que cinicamente dizem defender os direitos humanos. Vale lembrar que todos os julgamentos que condenaram os genocidas do regime militar na Argentina, país latino americano mais avançado nesse quesito, se iniciaram a partir de ações judiciais, mas só se desenvolveram e lograram sucesso com a mobilização popular massiva.

Não podemos também ficar a mercê de setores reformistas, como Tarso e Vanucchi, que defendem a punição com o fundamento de que as torturas foram crimes comuns que desrespeitaram o próprio ordenamento jurídico do regime militar. Aceitar isso significa ser complacente com a legalidade ditatorial e não compreender que essa política de extermínio era proveniente do próprio Estado e era funcional ao regime daquele momento. É por isso que é necessário punir todos os participantes desses atos horrendos, desde os executores aos mais altos generais que comandavam as operações, desde um ponto de vista de que foram crimes de genocídio e contra a humanidade, garantindo uma ferrenha punição e cárcere comum aos torturadores. Muitos desses coronéis e militares assassinos continuam atuando até hoje, são os mesmos que comandam as operações que assassinam a juventude pobre e negra nas periferias brasileiras. Também não podemos esquecer que por trás dos militares estava a burguesia que patrocinava e acobertava os crimes. Esses empresários e empresas continuam até hoje lucrando e seguem impunes. A “Rede Globo de televisão”, o jornal “ O Estado de S.Paulo”, algumas montadoras de automóveis do ABC, entre muitas empresas, são exemplos disso. É necessário punir essas empresas e expropriar seus bens para garantir a indenização aos familiares dos presos políticos. Nos marcos da lei de anistia isso é impossível, por isso, também lutamos pela sua revogação, pois não podemos conviver sob a base dessa lei que representa o pacto com os torturadores. Reiteramos que apenas a mobilização da classe trabalhadora e do povo, de maneira independente, poderá garantir punição a todos os genocidas, torturadores e seus cúmplices capitalistas.

Nesse sentido, fazemos um chamado ao NEDA, à organização Consulta Popular, ao NATRA e à todas as entidades estudantis da UNESP Franca para uma ampla campanha para propagandear o tema e que exija a punição aos crimes cometidos pela ditadura militar, colocando-os no seu verdadeiro lugar, como crimes de genocídio e contra a humanidade.

Rafael Borges 4° ano direito diurno
Militante da Liga Estratégia Revolucionária-Quarta Internacional (LER-QI) e membro do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Unesp-Franca.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

A justiça para os ricos!

Há algumas semanas a imprensa deu enorme enfoque para uma operação da Polícia Federal- Operação Satiagraha- que culminou na prisão do ex-banqueiro Daniel Dantas. Não era para menos, pois num país onde a polícia e a justiça cotidianamente persegue e extermina trabalhadores, pobres e negros, fatos como a prisão do ex-banqueiro se tornam inéditos. O governo Lula, obviamente, tratou de dizer que durante seu mandato o combate à corrupção e aos “crimes de colarinho branco” cada vez mais se intensificam.

Todavia, uma leitura mais atenta do quadro político e jurídico nacional nos mostra uma realidade bem diferente do discurso de Lula. Para além dos “shows” da polícia federal, a grande maioria dos políticos e empresários presos nas operações já se encontram livres e de volta às suas vidas de luxo e ostentação. A justiça é sempre ágil e eficiente quando se trata de liberar e absolver os ricos.


Foi exatamente com a prisão de Dantas que se cristalizou um exemplo cabal de que a justiça está até o seu limite comprometida com a classe dominante. Dois dias depois de sua prisão, o ex banqueiro, que está sendo acusado de crimes de lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, evasão de divisas, formação de quadrilha e tráfico de influência para a obtenção de informações privilegiadas em operações financeiras, acabou sendo solto por conta de um habeas corpus concedido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, pois este considerava sua prisão “desnecessária”. Justamente Mendes que quando assumiu a presidência do STF se apressou em hostilizar os movimentos de trabalhadores rurais sem terra, demonstrou que o mais alto órgão do poder Judiciário brasileiro e seu presidente estarão sempre dispostos a colocar em liberdades banqueiros corruptos e, ao contrário, criminalizar trabalhadores que lutam por mínimos direitos democráticos, como a reforma agrária.


Um dia depois, a prisão preventiva de Dantas foi mais uma vez expedida pela 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, e mais uma vez mostrando sua eficiência na liberação de banqueiros corruptos, o presidente do STF concedeu novamente o habeas corpus para Dantas. É importante salientar que no segundo habeas corpus e soltura de Dantas, o ministro Gilmar Mendes suprimiu duas instâncias, ou seja, desconsiderou o Tribunal Regional Federal (TRF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em outras palavras, rasgou a Constituição da República. O habeas Corpus é um remédio constitucional quando alguém sofre ou se acha ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. O ordenamento jurídico,todavia, prevê que inicialmente o Habeas Corpus seja apreciado por um juiz federal. Se o juiz federal denegar a ordem, outro habeas corpus deve ser proposto junto ao Tribunal Regional Federal. No caso de insucesso, deve-se impetrar outro pedido de habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça. Caso denegado, o último degrau será o STF, que aprecia a ilegalidade do tribunal inferior.A decisão liberatória de Daniel Dantas, proferida no segundo habeas corpus e em sede liminar (caráter de urgência) pelo ministro Mendes, está maculada com o vício da incompetência e é manifestamente nula. Como partiu da presidência do Supremo Tribunal Federal, acabou cumprida. È um exemplo cabal de que quando se trata de ricos e poderosos, os ministros do STF, que aliás são indicados pelo Presidente da República, e a justiça em geral, estão dispostos a descumprirem as leis escritas pelos próprios ricos e poderosos.



Os trabalhadores e pobres não devem confiar na justiça dos ricos. Primeiro, por que o judiciário é formada por leis e mecanismos jurídicos provenientes do Congresso corrupto e funcional aos interesses da burguesia, e também por que os juízes já deixaram claro de que lado estão. Devemos confiar apenas na própria força dos trabalhadores, utilizando os sindicatos combativos, organizações de direitos humanos e organizações políticas como instrumento de mobilização e também para garantir investigações independentes da justiça burguesa.



O Estado “policialesco” e o cinismo de Gilmar Mendes.


Passada a operação da Polícia Federal - Satiagraha- surge agora um novo debate no cenário político – jurídico brasileiro. A Agência Brasileira de Inteligência está sendo acusada de realizar grampos de escuta telefônica no gabinete de Gilmar Mendes sem a autorização da justiça – o que no Brasil é ilegal. Porém, o fato mais intrigante de toda essa novela de acusações, foi a declaração do ministro Mendes que disse: “Parece ser a instauração de um estado policialesco no Brasil...”. O cinismo de Mendes parece não ter limite. Esconde que o “estado policialesco” é essência intrínseca ao Estado democrático de Direito, ou seja, o Estado Burguês.


Não é difícil chegar a essa conclusão, basta vermos o número de chacinas e massacres realizados cotidianamente pela polícia nas grande metrópoles e também no campo. Massacres como o do morro do alemão no RJ, onde 19 pessoas foram torturadas e mortas por policiais, ou casos como o do morro da providência, onde militares do exército entregaram três jovens para serem assassinados por uma facção rival, mostram claramente a escalada de violência do Estado contra os pobre e trabalhadores. Dados da Anistia Internacional mostram que só a polícia carioca matou 1260 pessoas em 2007, e a previsão é que esse número aumente 11% em 2008!.


Se o grampo instaura só agora um estado policialesco como então o ministro Gilmar Mendes caracterizaria fatos como o massacre dos Carajás, onde 19 trabalhadores rurais foram mortos por policias sem que ninguém seja punido depois de dez anos do fato ocorrido?


Ou então do menino de 14 anos que foi torturado até a morte por policiais dentro do seu próprio quarto na cidade de Bauru, no interior de SP. Ou como o do comandante da policia do Rio que deu uma declaração fascista ao dizer que o BOPE é o inseticida social do RJ?


O Fato é que o cinismo de Mendes encarna bem a definição de Direitos Humanos para os ricos e poderosos. O extermínio de trabalhadores e pobres não significa nada para estes políticos, juízes, militares e empresários.


É por isso que não encaramos os Direitos Humanos do ponto de vista da burguesia e do Estado, pelo contrário, achamos que é fundamental o papel de juristas que utilizem os mecanismos jurídicos contra a criminalização dos movimentos socais e da classe trabalhadora, que lutem pela expansão dos direitos e garantias fundamentais, mas que sejam conscientes do limite do direito, e batalhem para que a classe trabalhadora e o povo pobre tomem em suas mãos a luta pelos direitos humanos. Só assim, através de mobilizações operárias e investigações independentes do Estado e de todos os setores da burguesia, e com o auxílio de juristas comprometidos com a luta dos trabalhadores, será possível levar a frente as demandas democráticas e os direitos humanos.


Faça parte do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos


O Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos inicia-se seus trabalhos na Unesp Franca na perspectiva de estudar, debater e responder aos problemas mais sensíveis da classe trabalhadora e do povo pobre. Debatendo os Direitos Humanos desde um ponto de vista da própria classe trabalhadora.


Chamamos a todos os estudantes e profissionais do Direito que estejam dispostos a colocarem seus conhecimentos jurídicos em defesa das lutas e direitos dos trabalhadores a nos ajudarem na tarefa de construção do Núcleo.


Rafael Borges
Discente do 4° ano de Direito da Unesp
Membro do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos
Militante da Liga Estratégia Revolucionária-Quarta Internacional